Agora que entrou em baixa a temporada de caça ao contribuinte, e que a maioria de nós já prestou contas à famigerada Receita Federal, é uma boa hora para refletir sobre o que realmente significa para o nosso bolso o tal de imposto de renda. Para começar o tributo peca pelo nome, já que incide prioritariamente sobre os ganhos do trabalho, e atinge principalmente a população assalariada, justamente aquela que não tem meios de sonegar.
E além disso é cobrado de forma altamente discriminatória, porque enquanto esses mesmos assalariados o pagam com meses de antecedência, quem realmente declara (e vive de) renda, só precisa prestar contas e pagar o que deve entre março e abril do ano seguinte. Quem vive de renda, de especulação, empresas e... bancos!!!
Não fui eu quem inventou a ganância. Nem me considero responsável pelos bancos cobrarem juros estratosféricos na concessão de crédito. Mas o fato é que dinheiro nos custa muito caro, então não é demais raciocinar sobre o que acontece com o nosso, quando é descontado na fonte, à título de pagamento antecipado de imposto de renda. Sabe o que acontece? Nada. Ele cai numa espécie de “buraco negro” da usura oficial, e não rende nada, ao contrário de todos os demais dinheiros em circulação pelo país.
De janeiro a dezembro você vai sendo descontado de valores que podem chegar até 27,5% do seu salário, à fundo perdido. E no ano seguinte essa sua poupança compulsória e sem rendimentos, ainda continuará assim pelos meses de janeiro a abril ou maio. E quando chegar a hora de calcular o imposto devido, o que foi recolhido antecipadamente, vai valer apenas seu valor nominal. Em 17 meses, seu dinheiro não terá sido atualizado em absolutamente nada.
Na pior das hipóteses, vamos considerar que você colocasse esse dinheiro na poupança. Por mais irrisório que seja o rendimento, em 17 meses, alguma coisa você teria faturado. Mas cruel mesmo é imaginar que você pode ter precisado pedir ao banco um empréstimo, ou que tenha avançado no cheque especial. Enquanto uma parte do seu salário repousa indisponível, você vai se enredar em dívidas, pagando os maiores juros do planeta.
Na arbitrária matemática oficial que vem sendo praticada no Brasil, o dinheiro de uns (como os bancos) vale demais, enquanto que o dinheiro de outros (os cidadãos) vale muito pouco... ou até pode não valer nada. E na situação econômico/financeira em que vivemos, com as taxas de juro que nos assolam, dinheiro que não vale nada para o seu legítimo dono, é dinheiro confiscado.
Além de pagar antecipadamente, o cidadão contribuinte é sujeito à insuportável pressão psicológica na época da declaração, tratado como irresponsável que não tem consciência de suas obrigações, ou como um sonegador em potencial, que tem que enfrentar até a ameaça de multa se não declarar aquilo que... já pagou!!!! Não consigo acreditar que não exista outro processo mais respeitoso e mais humano para tratar aqueles que sustentam a economia do país.
O mais assustador de tudo isso, para mim, é que ainda precise estar escrevendo sobre o assunto, e que essa situação exista e persista sem maiores reações. Recentemente li algumas crônicas e artigos tratando do caso, o que reacendeu minhas esperanças, mas o fato é que a maioria dos interessados – que deveria ser toda a população brasileira trabalhadora, inclusive aquela parcela que ainda não desconta IR na fonte – parece sobreviver em estado de anestesia, sem muita preocupação com seus direitos mais básicos.
Já enfrentamos a maior carga tributária do mundo. Se os cidadãos trabalhadores e responsáveis desse país não tomarem as rédeas do próprio destino, cumprindo seus deveres, mas atentos aos seus direitos... de confisco em confisco, de corrupção em corrupção, de privilégios aos poderosos às políticas racistas, qualquer dia desses vamos estar voltando aos tempos da escravidão...
Célia Borges
3 de maio de 2009
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