9 de maio de 2008

MULHER NA HISTÓRIA – Brasileiras e pioneiras (segunda parte)


Apesar da discriminação sofrida pela mulher no decorrer da nossa história, refletindo o papel secundário que lhe foi atribuido durante séculos, muitas pioneiras começam a surgir no início do Século XVIII, conquistando espaços à custa de suas inteligências e capacidades. Buscando formação técnica ou reivindicando igualdade de direitos, pode-se dizer que venceram porque não desistiram, enfrentando todo o tipo de obstáculos.

Essa chamada “revolução feminina” não aconteceu repentinamente, ela foi se estabelecendo passo a passo, primeiro através de conquistas pessoais, mas em seguida, à partir do Século XIX, ganhando contornos cada vez mais coletivos. Os casos das mulheres que se destacaram, por raros, acabaram recebendo notoriedade, e servindo de exemplos, cada vez mais influentes, para as demais mulheres.

Nísia Floresta – Na ponta desse pioneirismo, é preciso citar, por questão de justiça, o papel de Nísia Floresta, que em 1832 publicou o primeiro livro de que se tem notícia tratando dos direitos da mulher à instrução e ao trabalho. Sob o título “Os Direitos da Mulher e a Injustiça dos Homens”, a obra exigia que as mulheres passassem a ser consideradas como seres inteligentes e merecedoras de respeito pela sociedade.

Nascida em 12 de outubro de 1810, em Papari-RN, no Sítio Floresta, era filha de um advogado e recebeu o nome de batismo Dionísia Gonçalves Pinto. Casada aos 13 anos, separou-se em seguida. Em 1824 mudou-se para Pernambuco, e em 1828 passou a viver com o advogado Manuel Augusto de Faria Rocha, com quem teve em 1830 a primeira filha, Lívia Augusta.

Em 1831 estréia nas letras, publicando artigos no jornal Espelho das Brasileiras, e no ano seguinte lança seu livro, inspirado da obra da feminista inglesa Mary Wollstonecraff, “Vindications of the Rights of Woman. Nessa obra, assume o pseudônimo pelo qual viria a ser sempre conhecida: Nísia Floresta Brasileira Augusta. Em 1833 nasce seu segundo filho, Augusto Américo, e ela muda-se para Porto Alegre-RS com os filhos e o companheiro, mas esse vem a falecer a seguir, aos 25 anos.

Em 1837 transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde no ano seguinte anunciava a inauguração do Colégio Augusto. Nos anos seguintes publicou vários livros, como Conselhos à Minha Filha (1842), Daciz ou a Jovem Completa, Fany ou O modelo das Donzelas e Discurso às suas Educandas (todos em 1847); A Lágrima de Um Caeté (sob o pseudônimo Telesila, em 1849); e Dedicação de Uma Amiga (em dois volumes, em 1850). Viveu na Europa (Paris, Roma e Lisboa) por vários períodos, tendo escrito em publicações desses países, e em vários idiomas, até seu falecimento em 1885.

Ana Néri – A mais famosa de nossas pioneiras, é sem dúvida, Ana Néri. Nascida em 13/12/1814, na vila de Cachoeira de Paraguaçu-BA, foi a primeira mulher a se dedicar à enfermagem no Brasil, tendo servido como voluntária na Guerra do Paraguai. Em sua homenagem, em 1926, Carlos Chagas deu seu nome à primeira escola oficial brasileira de enfermagem, e caracterizada por ser uma instituição de alto padrão.

Ana Justina Ferreira Néri, já viúva do capitão-de-fragata Isidoro Antonio Neto, na ocasião do conflito, não se conformava ao ver seus três filhos, o cadete Pedro Antonio Néri, e os médicos Isidoro Antonio Néri Filho e Justiniano de Castro Rebelo, além de dois irmãos oficiais do Exército serem convocados, e decidiu escrever ao presidente da Província uma carta, oferecendo seus serviços como enfermeira.

Proposta aceita, ela parte da Bahia, de onde nunca havia saído, em 1865, para trabalhar como auxiliar no corpo de saúde do Exército, servindo inicialmente no hospital de Corrientes, ao lado de um pequeno grupo de freiras vicentinas. Exerceu a profissão também em Salto, Humaitá, Curupaiti e Assunção. Na capital paraguaia, sitiada pelo Exército Brasileira, ela montou com recursos próprios, e na casa onde vivia, uma enfermaria modelo, na qual trabalharia com dedicação até o final da Guerra, na qual perdeu o filho Justiniano e um sobrinho.

Ao voltar ao Brasil em 1870, vê seu trabalho festejado e reconhecido, tendo recebido, além de condecorações, uma pensão vitalícia concedida pelo Imperador, e com a qual pode educar quatro órfãos que trouxera do Paraguai. Ana Néri morreu no Rio de Janeiro, em 20/05/1880, e uma das homenagens que perpetua sua história é o retrato pintado por Vitor Meireles, e que ocupa lugar de honra no Paço Municipal de Salvador.

Chiquinha Gonzaga - No campo das artes, esse nome é uma verdadeira lenda na História do Brasil. Nascida no Rio de Janeiro, em 17/10/1847, Francisca Edwiges Neves Gonzaga foi compositora e pianista de sucesso, tendo sido também a primeira mulher a reger uma orquestra no Brasil. Seu talento inquestionável foi o melhor argumento para vencer os preconceitos da época, inclusive no aspecto da sua vida pessoal. Casada por imposição da família, teve a coragem de se separar, após o que assumiu sua relação com o engenheiro João Batista.

Musicista independente, tocava piano em lojas de instrumentos musicais, dava aulas de piano e também se apresentava em festas, ao lado de um grupo de músicos como Joaquim Calado. Preocupada em adaptar o som do piano ao gosto do público, tornou-se a primeira compositora popular do país. Seu sucesso começou em 1877, com a polca Atraente. Mas a notoriedade veio em 1897, com a versão estilizada do Corta-Jaca, e a consagração, dois anos mais tarde, com a marcha Abre-Alas, a primeira música escrita para o carnaval, para o Cordão Rosa de Ouro, do bairro carioca do Andaraí.

Chiquinha foi uma precursora também no teatro de variedades, onde estreou em 1885 com a comédia de costumes A Corte Na Roça. Em 1911 conquistou seu maior sucesso no gênero, com a opereta Forrobodó, que chegou a 1.500 apresentações e foi o melhor desempenho de uma peça do gênero durante muitos anos. Em 1934, com 87 anos, escreveu a partitura da opereta Maria. Ao todo, é autora de mais de duas mil composições, sendo 77 para peças teatrais. Foi também ativa abolicionista, e fundadora da Sociedade Brasileira de Autores Teatrais.

Mais pioneiras – Conforme escrevi no primeiro texto dessa série, a pesquisa sobre o assunto parece infinita..e quanto mais se pesquisa, mas preciosidades se encontra. Em vista disso, só posso prometer novos capítulos, nem eu mesma posso avaliar quantos. Mas a pesquisa é estimulante, e pretendo continuar nela. Se os prezados leitores e leitoras quiserem compartilhar seus conhecimentos, e colaborar para enriquecer o tema, saibam que serão recebidos de braços abertos.

Célia Borges

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