22 de fevereiro de 2008

XV - Estudar pra quê? Trabalhar pra quê?

Quem tem filhos em idade escolar, atualmente, além das preocupações com a violência que atinge a juventude e a adolescência, deve ter lá suas dificuldades para convence-los de que ainda vale à pena estudar, e pensar em ter uma profissão no futuro. Já foi comum, quando nós, os pais e avós de agora eramos crianças, que tivéssemos na ponta da língua uma resposta para a tradicional pergunta: “o que você quer ser quando crescer?” Queríamos ser professores, médicos, engenheiros, sonhávamos com um futuro que nos daria emprego garantido, prestígio e segurança.

As gerações dos que nasceram à partir da década de 70, já encontraram o mundo muito diferente, e com suas motivações peculiares. O sucesso deixou de significar o magistério, a medicina ou outra formação de nível superior, na medida em que os ídolos de maior prestigio passaram a ser os jogadores de futebol, automobilistas, atores e atrizes, as modelos. E afinal, é um traço inerente à natureza humana o querermos refletir aquilo que admiramos. Ou que somos levados à admirar, por força da comunicação.

Mesmo assim, ainda sobreviveu por muito tempo a motivação para o estudo, e pudemos ver, acompanhando o crescimento da população, o aumento do número de escolas e universidades, a diversificação de cursos e áreas de interesse, especialmente em conseqüência do desenvolvimento tecnológico. E a escolha de uma profissão pode até ter ganho em qualidade, na medida em que o estudante passou a ser livre das pressões familiares, tendo mais espaço para realizar as suas vocações.

Os exemplos de sucesso, entretanto, continuam a ser um elemento de forte influência do ponto de vista da motivação dos jovens com relação ao futuro, e isso se acentua entre a população mais pobre, e com pouco acesso à informações sobre outras possibilidades que não as mais óbvias. Por isso é que, entre esses jovens, é maior o número daqueles que querem ser jogadores de futebol, na perspectiva de um sucesso rápido e fácil, e que não exige estudo. É maior o número daquelas que querem ser modelos, atrizes, dançarinas, pelo mesmo motivo. Ou queriam...porque a maior atração para aqueles que não querem estudar, atualmente, mas sonham em “se dar bem” sem grande esforço, é entrar para a política.

Já vai longe o tempo em que a maioria das nossas autoridades do legislativo e do executivo tinham boa educação e alguma escolaridade, inclusive como pré-condição para o pleno exercício de seus mandatos. Hoje, o que se vê, especialmente entre os vereadores, primeiro passo na carreira política, é um predomínio de analfabetos, semi-analfabetos, analfabetos funcionais, ou então gente que parece que simplesmente fugiu da escola no meio do caminho. Eles são os preferidos do eleitor, que parece também querer se ver refletido no poder.

A eleição de um semi-analfabeto para a presidência da República, está longe de ser o auge dessa tendência, mas é um decisivo elemento motivador para justificar uma classe política com cada vez menos escolaridade – já que educação, quer dizer, a boa educação, parece ser um valor em extinção em todas as classes e camadas da população.

A política, hoje não é produto de idealismos, mas de ambições pessoais, uma garantia de sucesso, prestígio e prosperidade, sem ser preciso dispender grandes esforços. O cidadão com mais escolaridade e educação, com fama de honesto, com propostas sérias, dificilmente consegue bons resultados nas eleições municipais. E quando se elege, e não se rende aos hábitos da maioria, provavelmente não será reeleito. O que o político típico de hoje quer é prestígio, pouco trabalho e muito dinheiro (mesmo quando o salário é pequeno, há sempre muito o que se explorar no cargo).

Assim como os estudos, o trabalho também não vem sendo muito privilegiado nos nossos dias. As faixas de população que mais trabalham, mais produzem, mais pagam impostos, são exatamente aquelas que vêm sendo cada vez mais penalizadas pela política, seja econômica, seja social. Paga-se cada vez mais por tudo, e ainda se leva a fama de ter as culpas por todos os problemas do país.

Razão tem aqueles que não trabalham...não só porque não conseguem emprego, mas porque podem viver de “bolsa-família”, “bolsa-escola”, bolsa isso, bolsa aquilo. Na nossa distribuição de riquezas, o trabalhador vem pagando pra sustentar quem não faz nada (não por culpa sua, mas por culpa de uma política que privilegia a ociosidade, não investe em frentes de trabalho e na criação de empregos, o que aliás, era a grande proposta desse governo).

Nem mesmo a aposentadoria, que era o prêmio para quem trabalhou toda uma vida, é hoje garantia de nada. Com a desculpa de evitar colapso na Previdência, deu-se o calote no aposentado, que hoje, para manter uma condição de sobrevivência razoável, está tendo que voltar a trabalhar. E os rombos, os desvios, a má administração continuam iguais, não tendo melhorado em nada essa Conta Previdência. Enquanto isso os vereadores podem se aposentar depois de dois mandatos (oito anos), o cidadão comum tem que chegar à idade avançada, ainda que tenha começado a trabalhar na adolescência. Sem falar em certas autoridades, que acumulam diversas aposentadorias.

Se tivesse filhos nessa faixa de idade, é claro que eu ainda iria insistir para que estudassem o máximo, para que se educassem. Mas provavelmente se algum deles preferisse a ociosidade, a informalidade ou a política, eu não teria muito o que argumentar. Porque estudar ou trabalhar nos dão cada vez menores garantias para o futuro.

Célia Borges