14 de maio de 2008

PAISAGISMO E JARDINAGEM XIII – De maio a agosto, a melhor época para cuidar das plantas


O jardineiro, seja profissional ou amador, precisa estar atento à certas condições naturais, que podem ser influenciar no sucesso do seu trabalho. Os ciclos da natureza estão entre esses fatores, e entre a prática e a ciência, alguns deles vêm sendo plenamente confirmados, como o que define os meses sem erre – maio, junho, julho e agosto – como os mais indicados para várias atividades, como as podas, adubações e plantio de sementeiras para as hortas.

A escolha se explica tanto do ponto de vista prático quanto do científico: entre o outono e o inverno, a maioria das plantas entra em estado, por assim dizer, de hibernação. Literalmente, elas descansam da intensa atividade vegetativa do restante do ano. Esse é, portanto, o momento oportuno para prepara-las para a fase de renovação produtiva, que se apresenta à partir de agosto, e mais intensamente em setembro, com a chegada da primavera.

É a época mais indicada tanto para as podas e reformas dos jardins, quanto para a limpeza dos vasos. Em cada caso, é importante observar tanto a saúde da planta quanto o interesse decorativo, fazendo a poda na medida da expectativa de crescimento da espécie, assim como respeitando outros aspectos, como a quantidade de sol, umidade e exposição ao vento.

Deixar crescer demais plantas com perfil de pequenas, por exemplo, pode comprometer a produção de folhas e flores. Na dúvida entre o demais e o de menos, é melhor ficar no meio termo. Apesar de essa época ser recomendável para as podas de formação e as podas radicais, nada impede que a planta seja submetida às podas de limpeza e às esculturais, durante o processo de crescimento.

As podas de formação, adequadas à essa época do ano, são importantes no sentido de se dar às plantas orientação sobre os aspectos que se espera que elas tenham. Um projeto pré-estabelecido é relevante auxiliar nessa hora, quando se pode adaptar cada planta ao projeto do jardim. A poda radical também é oportuna nessa época, nos casos em que é preciso tentar renovar plantas que reagiram de forma negativa às condições oferecidas, e se encontram em mau estado. Nesses casos é indicada também uma adubação, e observação da luz e umidade exigidas.

A questão da adubação já é um pouco mais complexa, diante da variedade de produtos e possibilidades de aplicação. A tendência para o uso de produtos naturais, sem aditivos químicos, vem sendo cada vez mais considerada. A produção de adubos à partir da reciclagem de resíduos domésticos é possível para quem dispõe de espaço suficiente para a produção de compostos, solução barata mas que exige alguma dedicação. Nos demais casos, expor suas necessidades no comércio especializado pode ajudar na escolha dos produtos indicados, de acordo com o tipo de planta, o estágio de crescimento e o tamanho do local a ser adubado.

Prometo mais esclarecimentos em próximas postagens. Mas também estou à disposição para o esclarecimento de dúvidas, através de comentários ao texto, incluído o endereço de e.mail para resposta.

Célia Borges

LIVROS – As camélias do Leblon e a Abolição da Escravatura


Nesse maio de 2008, em que se comemoram os 120 anos da Abolição da Escravatura no Brasil, é momento bastante oportuno para se rever, e reavaliar, esse episódio histórico de tão grande impacto na vida social, política e econômica do país, que se por um lado pecou por tardio, por outro ainda reflete uma problemática racial que se prolonga até os nossos dias.

Alguns capítulos desse processo estão admiravelmente revelados no livro As Camélias do Leblon e a Abolição da Escravatura, do professor Eduardo Silva, publicado em 2003, e que tem como subtítulo “uma investigação de história cultural”. Porque aliás, é disso mesmo que se trata: não um livro de história acadêmico, cheio de nomes e datas, mas o verdadeiro trabalho de um “detetive histórico”, percorrendo meandros, lendo nas entrelinhas, e desvendando uma história muito mais interessante do que a oficial.

Essa é uma espécie de “história secreta do movimento abolicionista”, como admite seu autor, que já foi chefe do setor de história da Fundação Casa de Rui Barbosa, e escreveu outras obras memoráveis, como Barões e Escravidão (1984), As queixas do povo (1888), Negociação e Conflito – a resistência negra no Brasil escravista ( em parceria com João José Reis, em 1989) e Dom Oba II D’África, o Príncipe do Povo – Vida, Tempo e Pensamento de um homem livre de cor (1997).

“As Camélias do Leblon” expõe e esclarece sobre situações e personagens que são ao mesmo tempo heróicos e românticos, e por outro, absolutamente reais, e a maioria deles exilada da literatura oficial. As camélias foram um símbolo aparentemente insuspeitado do movimento, caracterizaram um quilombo com relevante papel na luta abolicionista, e funcionaram até mesmo como uma espécie de código na comunicação dos demais abolicionistas com a Princesa Isabel.

Outro aspecto que merece consideração é sobre o esforço humano, através da quantidade e empenho de pessoas envolvidas no movimento, tanto brancos como o português José Magalhães Seixas (que se desdobrava como fabricante de malas na Rua Gonçalves Dias e a chefia do Quilombo do Leblon), quanto ás multidões de negros revoltados que se expuseram na luta, através das fugas em massa e da formação dos diversos quilombos. Direta ou indiretamente, homens influentes como Rui Barbosa, André Rebouças e Coelho Neto, assim como Joaquim Nabuco e José do Patrocínio, tiveram papéis relevantes nesse processo de abolição da escravatura.

Além da relevância do tema e da revelação de episódios valiosos e interessantes da nossa historia, o livro vale pela qualidade do texto do professor Eduardo Silva, que é objetivo, mas claro e agradável à leitura. E para quem ficar fã, sugiro em seguida a leitura do Dom Obá, que segue uma linha de texto histórico que além de informativa, é um verdadeiro prazer para o leitor. Ambos os livros merecem a atenção de brasileiros, brancos e negros. Prazer e oportunidade para focalizar melhor nossos papéis na história.

Célia Borges

MULHER NA HISTÓRIA – Brasileiras e pioneiras (terceira parte)


A História das mulheres no Brasil é pontilhada de heroísmos, mas a maioria desses casos acabou se perdendo no anonimato. Mesmo com o despontar, no ínicio do Século XX, das vocações femininas em grande número de atividades que até então lhes eram literalmente proibidas, poucas são as histórias de mulheres brasileiras pioneiras que costumam, ou ainda continuam, a ser lembradas.

Elas surgiram nos mais variados pontos do país, mas existem alguns exemplos de efervescência feminista que merecem atenção, como é o caso da seqüência de mulheres baianas que se destacaram, mostrando coragem e empreendedorismo ainda mais surpreendentes, se considerarmos o reduto tipicamente masculino no qual viviam.

Desde Ana Néri, citada no texto anterior dessa série, e até antes dela, é grande o número de exemplos, como o de Inês Sabino (1853/1911) escritora nascida em Salvador, abolicionista, que viveu no Rio, São Paulo, e publicou vários livros, com destaque para “Mulheres Ilustres do Brasil” (1899); Leolinda de Figueiredo Daltro (1860/1935), feminista e indianista, defendeu a alfabetização das nações indígenas e fundou o Partido Republicano Feminino, em 1910; Violante Ximenes Bivar e Velasco (1816/1874) nascida em Salvador e pioneira no jornalismo, tendo escrito e dirigido o Jornal das Senhoras; Maria Luisa Bittencourt, advogada e primeira deputada estadual da Bahia, eleita em 1934, usou seus conhecimentos de direito para defender a emancipação das mulheres no Código Civil brasileiro; e Maria José de Castro Rebelo Mendes, natural de Salvador, que foi a primeira mulher a ingressar no serviço diplomático brasileiro, sendo aprovada no Itamarati em 1918.

Em outros pontos do país, e paralelamente, outros exemplos mereceriam nota, como o caso de Mirtes Campos, no Rio de Janeiro, que foi a primeira advogada a conseguir registro na Ordem dos Advogados do Brasil. Embora muito pouco sobre essa pioneira conste das fontes de pesquisa tradicionais, sabe-se que, ainda estreante, em 1906, derrotou em julgamento um célebre promotor de justiça. Ainda no Rio de Janeiro, é relevante o caso da professora Celina Guimarães Viana, dona do primeiro título eleitoral feminino, obtido em 1927, embora seu direito a voto só viesse a ser assegurado em 1932.

Nas artes e na literatura, são indiscutíveis os talentos que se revelaram, começando por Anita Malfatti, nascida em São Paulo em 1896, que foi uma desbravadora tanto como mulher como quanto artista, antecipando com seu trabalho, desde 1914, o que seria a revolução da linguagem artística verificada na Semana de Arte Moderna de 1922. Idolatrada por uns, mas crucificada pela maioria, é reconhecida, sem favor, como um dos maiores nomes das nossas artes plásticas.

A literatura foi área pródiga na revelação de talentos femininos, e a relação seria interminável. Sintetizo citando Cecília Meirelles, por ter sido talvez a maior poeta brasileira, apesar de outros nomes tão valiosos, que recomendo ao leitor pesquisar. Nascida no Rio de Janeiro em 1901, conviveu com a perda dos pais na primeira infancia, sendo criada por uma avó açoriana. Precoce, recebeu seu primeiro prêmio literário em 1910, das mãos de Olavo Bilac. E em 1919 publicou seu primeiro livro de versos, Espectros. Enfim, e como outras brilhantes escritoras da nossa história, é um grande personagem, que merece maiores pesquisas por parte dos interessados.

Outra área que reúne exemplos brilhantes é a medicina, onde o pioneirismo destaca Rita Lobato, nascida em São Pedro do Rio Grande-RS, em 7 de junho de 1866, e que foi a primeira brasileira a cursar uma faculdade de medicina e a obter o título de doutora. Graduada em 10 de dezembro de 1887, na Faculdade de Medicina da Bahia (depois de ter estudado no Rio de Janeiro), defendeu tese sobre “métodos preconizados na cesariana”, tema na época considerado ofensivo, por ter abordado assunto tão pudico e reservado. Para obter seu diploma, teve que lutar contra inúmeras restrições, mas impôs-se como uma vencedora, concluindo em quatro anos um curso que levava seis. Ela foi a segunda médica da América Latina e a primeira vereadora do Rio Grande do Sul.

Em termos da relevância do talento e do trabalho, apesar de tantas figuras admiráveis da nossa história feminina, poucas se equiparam a Nise da Silveira, que enfrentou não apenas os obstáculos ao trabalho feminino, a perseguição política, e um desafio ainda mais difícil, que foi a compreensão da loucura. Seu trabalho no Centro Psiquiátrico do Engenho de Dentro foi revolucionou a psiquiatria praticada no país, o que lhe valeu respeito e reconhecimento internacionais.

Nascida em Alagoas, filha de um jornalista, estudou na Faculdade de Medicina da Bahia de 1921 a 1926, numa turma de 157 alunos em que era a única mulher – e uma das primeiras do Brasil. Casou-se com o sanitarista Mário Magalhães Silveira, com quem viveu até o falecimento dele, em 1986. Em 1927, com o falecimento do pai, muda-se com a família para o Rio de Janeiro. Em 1933 faz estágio na clinica neurológica de Antônio Austregésilo. Aprovada aos 27 anos num concurso para psiquiatra, em 1933, começou a trabalhar no Serviço de Assistência a Psicopatas e Profilaxia Mental, no Hospital da Praia Vermelha.

Nise foi militante da ANL – Aliança Nacional Libertadora – e durante a Intentona Comunista, denunciada por uma enfermeira por ter livros marxistas, foi presa e mantida no Presídio Frei Caneca por 15 meses. Ali conheceu Graciliano Ramos, preso nas mesmas circunstâncias, tendo se tornado personagem da admirável obra desse escritor, Memórias do Cárcere. De 1936 a 1944 permaneceu na semi-clandestinidade com o marido, afastada do serviço público por razões políticas. Durante seu afastamento fez leitura reflexiva sobre a obra de Spinoza, escrevendo o livro Cartas a Spinoza, publicado afinal, apenas, em 1995.

Em 1944, reintegrada ao serviço público, inicia seu trabalho no Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II, no Engenho de Dentro, onde retoma sua luta contra técnicas psiquiátricas que considera agressiva aos pacientes. Por se recusar a aplicar eletrochoques, é transferida para o trabalho de terapia ocupacional, atividade então desprezada pelos médicos. Em 46 criou uma seção de terapia ocupacional, onde os doentes, no lugar de tarefas como limpeza e manutenção, passaram a a utilizar os “ateliês”de pintura e modelagem.

Pioneira na difusão da psicologia junguiana no Brasil, começou a se corresponder com Carl Gustav Jung em 1954, e estimulada por ele apresentou uma mostra dos trabalhos de seus pacientes com o nome de Arte e Esquizofrenia, no II Congresso Internacional de Psiquiatria, em 1957, em Zurich. Estudou no Institute Carl Gustav Jung em dois períodos, 1957/58 e 1961/62, tendo recebido a supervisão da assistente de Jung, Marie Louise von Franz. Na volta ao Brasil formou em sua residência o Grupo de Estudos Carl Jung, que presidiu até 68, quando lançou o livro “Jung: vida e obra”.

Em 52 já fundara o Museu de Imagens do Inconsciente, preservando o trabalho dos internos e criando uma importante referência para estudos. Em 56 criou a Casa das Palmeiras, clinica voltada para a reabilitação de pacientes de instituições psiquiátricas. É longa e rica a história dessa brasileira pioneira, condecorada e tida como exemplo em diversos países. Além dos sete livros que escreveu e publicou, é personagem de estudos de Fernando Portela Câmara e Ferreira Gullar.

Célia Borges