28 de janeiro de 2010

ALDEIA GLOBAL – É preciso reinventar o Judiciário brasileiro



Em entrevista publicada pelo jornal O Globo do dia 3 de janeiro desse ano, sob o título “O Judiciário precisa ser reiventado”, o ministro do STF Joaquim Barbosa declara que “juízes tem responsabilidade pelo aumento da corrupção” no país. O assunto não obteve a repercussão que merecia, em parte diante das tragédias ocorridas na passagem do ano, em Angra e na Ilha Grande, e nos dias seguintes, em diversos pontos de outros estados. Poucos devem ter se dado conta disso, mas tratam-se das duas faces da mesma moeda. Quantos problemas poderiam ser evitados, se dispuséssemos de uma Justiça ágil e competente?
As inquietações do ministro Joaquim Barbosa com relação à ética no Judiciário são relevantes, como mostrou o noticiário dos últimos dias, passadas apenas algumas semanas da entrevista, nos dando conta que o Conselho Nacional de Justiça afastou o Corregedor-geral do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, desembargador Roberto Wider, por diversas suspeitas, entre as quais a formação de quadrilha e venda de sentenças. Venda de sentenças? Quer dizer que as leis perderam seu significado, e que a Justiça é só um produto ao alcance de quem paga mais?
Qualquer pessoa razoavelmente informada, sabe que isso acontece. A maioria, desinformada, não se sabe. Entre os que sabem, só uma minoria se manifesta. Os demais acham que não têm nada com isso, e enquanto omissos também são cúmplices dessa situação. É bom lembrar que ninguém está livre de, um dia desses, a injustiça bater à sua porta. Muito poucos têm a coragem de se expor, e protestar, denunciar, exigir mudanças. E me devolve um pingo de esperança que, entre os que se manifestam, esteja um ministro do STF.
Entre outras declarações, o ministro Joaquim Barbosa diz que “a impunidade é hoje um problema crucial no país. A impunidade no Brasil é planejada, é deliberada. As instituições concebidas para combatê-la são organizadas de forma que elas sejam impotentes, ineficazes na prática de ter uma ação eficaz”. Ele diz ainda “A Polícia e o Ministério Público, não obstante as suas manifestas deficiências e seus erros e defeitos pontuais, cumprem razoavelmente o seu papel. Porém, o Poder Judiciário tem uma grande parcela de responsabilidade pelo aumento das práticas de corrupção em nosso país”.
“A generalizada sensação de impunidade verificada hoje no Brasil decorre em grande parte de fatores estruturais, mas é também reforçada pela atuação do Poder Judiciário, das suas práticas arcaicas, das suas interpretações lenientes e muitas vezes cúmplices para com atos de corrupção, e sobretudo, com a sua falta de transparência no processo de tomadas de decisões”. Enfim, falou a autoridade, e eu não conseguiria dizer melhor.
Vale acrescentar que, mais que a impunidade propriamente, a certeza da impunidade é a principal cúmplice da delinqüência, da criminalidade, do abuso de poder e da arrogância dos poderosos. Uma Justiça lenta e complicada já garante que um minoria de réus seja penalizada. E as condenações decrescem, na medida do poder econômico dos acusados. O caso do afastamento do desembargador Roberto Wider da Corregedoria-geral do TJ-RJ é uma raridade, diante da quantidade questões que envolvem membros do Judiciário, e que por conta de um injustificável corporativismo, perdem-se no tempo, sem apuração ou condenação.
Juizes, em qualquer país do dito “primeiro mundo”, precisam ser pessoas acima de qualquer suspeita. Ministros de tribunais superiores deveriam ser eleitos por mérito e competência, e não por decisões políticas, como ocorre entre nós. Não é à toa que os criminosos dos filmes estrangeiros fogem para o Brasil. Nosso país se transformou em sinônimo de impunidade. Nosso Judiciário vivou piada, e piada de mau gosto. Se você acha que tudo bem, continue calado ou calada. Por que eu, mesmo correndo o risco de continuar falando ou escrevendo sozinha, não vou perder a oportunidade de fazer o meu protesto, e engrossar a corrente da qual, para minha admiração, o ministro Joaquim Barbosa passou a fazer parte. Eu sou cidadã, mereço respeito. E quero, no meu país, uma Justiça que mereça esse nome.
Célia Borges