29 de abril de 2008

PAISAGISMO E JARDINAGEM IX – Homenagem à Margaret Mee, a Dama das Orquídeas


O trabalho de jornalista nos leva, frequentemente, à situações surpreendentes e inesperadas. Algumas dessas circunstâncias conseguem mudar nossa vida, nossa visão do mundo, nossas áreas de interesse. Para mim, um desses momentos mágicos aconteceu quando tive a sorte e o privilégio de conhecer Margaret Mee. Essa mulher extraordinária, de pouco mais de um metro e meio de altura, conseguiu despertar o meu interesse pela botânica, a minha paixão pelas orquídeas, e como um desdobramento natural, minha dedicação à jardinagem e ao paisagismo.

Nosso primeiro encontro ocorreu em 1973, pouco depois de eu ter completado 22 anos. Apesar de três anos de militância na imprensa, e de já ter meu registro profissional, me considerava ainda uma principiante. Minhas áreas de atuação era, prioritariamente, esporte, educação e cultura. Sempre fui encantada com plantas e flores, mas não sabia nada à respeito, a não ser lembrar dos esforços da minha avó Mariquinha, nos canteiros de sua casa. Parti para a entrevista completamente insegura.

A motivação para a matéria era a exposição de seus trabalhos, inaugurada no dia 3 de outubro, e que ficou três semanas na Moorland Gallery, em Cork Stret, Londres. Os cerca de 30 desenhos expostos eram fruto de suas viagens à Amazonia realizadas desde 1968, sendo que alguns já haviam sido publicados pela Tryon Gallery, também de Londres, no livro “Flowers of the Brazilian Forrest”. Fiquei surpresa ao descobrir que ela já preparava um novo livro sobre o assunto. Poucas pessoas no país, naquela época, conheciam seu trabalho.

Margaret Mee era uma exploradora britânica – e botânica – da Amazônia, que já naquela época havia descoberto oito espécies desconhecidas de plantas silvestres. Aos 64 anos, já havia feito sete viagens de canoa pelo interior daquela região, coletando plantas. Ardente conservacionista, ela se preocupava em preservar as raízes das plantas coletas, para garantir nova brotação.

Depois registrava a planta em aquarelas, reproduzindo todos os seus detalhes, oferecendo em seguida os exemplares ao Jardim Botânico do Rio de Janeiro, que em sua homenagem deu o nome de Aechmea Meeana a uma bromeliácia da família dos abacaxis, descoberta por ela em 1971, nas terras pantanosas da Amazônia.

Nascida em Chesham, no condado de Buckingham, Inglaterra meridional, estudou em Londres na St. Martin’s School of Art, na Central Schol of Art anda Design e na Camberwell Scholl of Art, onde foi aluna de Victor Passmore, famoso artista britânico. Em 1952 veio para o Brasil em companhia do marido, o artista Greville Mee, e deu aulas de arte durante cinco anos na escola britânica de São Paulo. Fez, nesse período, inúmeras exposições entre São Paulo e Rio de Janeiro, e também nos Estados Unidos, no Smithsonian Institute of Washington.

Nessa primeira entrevista, que deveria ter durado uma ou duas horas, mas se prolongou até as tantas da noite, aprendi muitas coisas com ela. E ouvi histórias emocionantes, de como ela já havia escapado inúmeras vezes de onças, tarântulas e piranhas, no meio da mata, e em companhia apenas de um guia.

Uma das que mais me impressionou, e que nunca mais esqueci, foi do momento em que, precisando retornar ao ponto de contato, antes da cheia do rio, encontrou uma enorme cobra enrolada em sua rede de dormir, equipamento imprescindível na seqüência da viagem, e precisou que esperar que a cobra espontaneamente deixasse o lugar, embora correndo o risco de ficar isolada em situação de extremo risco. Levava sempre um revolver como medida de segurança, mas se orgulhava de nunca ter precisado usa-lo.

Ela me cativou em todos os sentidos, e nos anos seguintes procurei estar sempre atenta e sintonizada com seu trabalho. Tivemos mais uma entrevista, em anos seguintes, na volta de mais uma das suas viagens. Apesar da baixa estatura, da aparência frágil, e tendo como agravante uma certa dificuldade de locomoção em conseqüência de uma cirurgia na bacia, Mrs. Mee fez ainda muitas viagens à Amazônia nos anos seguintes, produzindo uma obra memorável.

Amiga de Burle Marx, se esmerava em dividir com ele seus achados. No momento em que a conheci, preparava-se para a oitava viagem à Amazônia, em junho de 1974, onde explorou o rio Nhamundá, em busca de espécies raras de orquídeas e clusias. Realizou ainda muitas, depois disso, deixando um patrimônio artístico e botânico admirável, que pode ser conhecido através dos seus diversos livros publicados e da instituição que leva seu nome, Fundação Margaret Mee. Também existem duas comunidades no Orkut em sua homenagem, uma criada por mim, Eu Amo Margart Mee, e outra por um grande amigo, Pajeh Índio do Bem, sob o título A Dama das Orquídeas.

Célia Borges