6 de junho de 2010

PARQUE NACIONAL DO ITATIAIA: AMPLIAÇÃO NÃO DEPENDE DAS TERRAS DO NÚCLEO



A atual direção do Parque Nacional do Itatiaia vêm defendendo, literalmente “com unhas e dentes”, a implantação de um Programa de Manejo, baseada em decreto de 1982. Essa medida, que implica na desapropriação da área do Núcleo Colonial Itatiaia, está sendo questionada na Justiça pelos moradores, já que, entre outras irregularidades do decreto, ele avança sobre área urbana e propriedades particulares, o que vai contra a legislação vigente.
A questão encontra-se, portanto, na esfera judicial, aguardando decisão. Mas a direção do PNI não se deu por satisfeita, e decidiu pressionar o Judiciário, na forma de uma Moção assinada pelo Conselho Consultivo do Parque Nacional do Itatiaia – CCPNI – e que foi apresentada na Assembléia Geral daquele conselho em 7 de maio de 2010, pegando os conselheiros de surpresa, já que o assunto não constava da pauta.
Mostrando consciência e maturidade, o Conselho pediu tempo para analisar a proposta, tendo sido marcada uma Assembléia Extraordinária, para 14 de maio, onde mesmo sem ter tido tempo de avaliar o outro lado da questão – já que a presidente da AAI, Leila Heizer, teve apenas cinco minutos nesse dia para expor as razões da instituição – os conselheiros aprovaram a Moção, com ressalvas, como pode ser verificado pela Ata daquela assembléia, se e quando ela for colocada à disposição para leitura.
O argumento da direção do PNI, que confundiu os conselheiros do CCPNI e que continua causando confusão nos meios ambientalistas e na imprensa, é de que a Ação Civil Coletiva da AAI vai impedir a ampliação do Parque Nacional do Itatiaia. Nada mais falso. Se a ação for vitoriosa, e o decreto de 1982 for cancelado, o governo federal tem todas as condições de editar um novo decreto, reincorporando uma área de mais de 28 mil hectares, já que a s terras particulares do Núcleo representam menos de dois por cento do total. Poderá até ampliar além disso, já que em 1908 o governo comprou dos herdeiros do Visconde de Mauá 48 mil hectares. Como terra não sai andando, essa área ainda deve estar lá, no mesmo lugar.
A atitude da direção do Parque no episódio da Assembléia da CCPNI reflete bem o comportamento que essas autoridades vêm adotando desde 2007, esmerando-se em caracterizar os moradores do Núcleo como invasores – o que não é verdade, porque são legítimos proprietários de suas terras – e inimigos do meio ambiente – o que também é falso, já que esses moradores foram comprovadamente responsáveis pela recuperação de uma mata secundária naquela região, que no início do Núcleo encontrava-se completamente devastada.
A estratégia tem sido a de convencer os crédulos e pouco informados de que existe um conflito de interesses entre o Parque e o dos moradores do Núcleo, e que a vitória de um corresponde à derrota do outro. E de que, quem apóia a AAI é contra os interesses ambientais. Entretanto, quem se dispuser a estudar os documentos do caso, vai perceber que a Ação da AAI demonstra uma muito maior preocupação ambiental que o Programa de Manejo, onde está claramente demonstrado que tais autoridades se dispõem a dispender enormes recursos na desapropriação de casas e hotéis, mas não prevêem medidas para a proteção dos seus outros 28 mil hectares, onde o que resta de mata nativa continua sujeita à incêndios e todo o tipo de ação predatória.
Os moradores do Núcleo sempre se notabilizaram pela preocupação ambiental, e nunca foram inimigos, mas sempre parceiros e apoiadores daquela unidade de conservação. Desconhecer isso é virar as costas para a história, e agir de má fé. Mas atual direção do Parque vem se esforçando em renegar essa história, e semear um preconceito que coloca os moradores do Núcleo como inimigos do Parque e da natureza. A forma como a Moção à CCPNI foi apresentada testemunha exatamente isso, um afã em desacreditar quem, pura e simplesmente discorda, e tem a coragem de ir à Justiça, defender seus direitos e opiniões.
É bom lembrar que a AAI tentou negociar a reclassificação da área, de forma a preservar as características ambientais de suas terras, mas mantendo as propriedades. E que a Ação foi um recurso extremo, diante da falta de diálogo. A atual administração do PNI não apenas não demonstrou interesse em abrir canais de negociação, como assumiu uma postura de posse sobre o que não lhe pertence – já que os imóveis não foram desapropriados -, impondo regras e limitações ao livre trânsito dos moradores do Núcleo, à prestação de serviços e entregas de compras em suas casas. Por tal autoritarismo e arbitrariedade, os moradores não tiveram outro recurso se não apelar para a justiça.
Funcionários públicos, que apenas estão lotados no Parque, prestando um serviço temporário, agem como se fossem seus proprietários. E se sentem no direito de manipular informações e opiniões para atingir seus objetivos, impedindo um debate livre e democrático, no temor de que ele possa enfraquecer seus argumentos, construídos sobre uma base falsa. A Ação da AAI, ainda que acatada e ganha na Justiça, não vai impedir a ampliação do Parque Nacional do Itatiaia, e é até uma ingenuidade acreditar nisso.
O Parque Nacional do Itatiaia pode ser ampliado, de diversas maneiras, mesmo com a exclusão da área do Núcleo Colonial Itatiaia. Por exemplo, por um decreto novo, que substitua o antigo, e que seja editado após novos estudos e demarcações... ou por uma divisão do Maciço do Itatiaia em pequenas reservas federais, estaduais e municipais, partilhando a responsabilidade pela conservação do meio ambiente com toda a sociedade.
Não há justificativa para que a atual direção do Parque Nacional do Itatiaia queira impor os termos de um decreto ultrapassado em mais de 25 anos, e se recuse a discutir novas propostas, que podem sim, e efetivamente, promover a proteção daquela unidade de conservação. E se a proposta deles é boa, porque não discuti-la? Por que é tão indispensável a imposição, ao invés da discussão?
Enquanto espera a decisão da Justiça, a atual administração do Parque faria melhor cuidando de suas responsabilidades, antes de propor Moções. Afinal, quem for hoje visitar o Parque Nacional do Itatiaia – a mais antiga reserva ambiental do país - vai encontrar estradas esburacadas, trilhas intransitáveis, cachoeiras interditadas, sinais de descuido e abandono por todos os lados... e isso, referindo-nos só ao que está mais visível e acessível.
É importante estarmos atentos para o fato de que, caso a AAI ganhe a Ação, isso não encerra o debate sobre a questão da ampliação do Parque. As terras ainda estarão lá – os mais de 28 mil hectares – e o parque, felizmente, ainda terá muito para onde crescer. O que preocupa é o que será feito dessa reserva, e se tão admirável patrimônio natural vai continuar sendo tratado com tanto descaso. Porque se a atual direção do Parque já não dá conta de uma manutenção mínima na ainda pequena área sob sua jurisidição, quem garante que vai ter competência para dar conta do resto?
Célia Borges

4 comentários:

tonilima05@yahoo.com.br disse...

Abordagem excelente e em perfeita sintonia com a realidade. Considerando que a propriedade particular não interfere no meio ambiente, bem ao contrário, o preserva melhor do que os agentes do governo, fica a pergunta: qual o interesse que se esconde por trás da abusiva conduta dos administradores do PNI? O mega projeto turístico parece indicar o caminho da resposta.

Valéria Borillo disse...

Em primeiro lugar, parabéns à jornalista Célia Borges pela apresentação clara, persistente e totalmente parcial no que tange aos interesses ambientais legítimos. Está se tornando minha paladina da justiça na região...

Em segundo lugar, uma questão, já levantada no comentário de Toni Lima: até quando os interesses econômicos falarão mais alto que os interesses da manutenção do nosso meio ambiente?
Por tudo que tenho visto neste País (em especial nesta região) tenho a estranha sensação que, depois de deixarem o planeta Terra no bagaço, os donos do dinheiro subirão em alguma nave espacial secreta e partirão rumo a outro planeta, deixando-nos como uma lixeira espacial a gravitar pelo espaço...

Maurício "ToNTo" Clauzet disse...

Célia, muito bem apresentada a problemática da ação da AAI.
Quando falta diálogo e sobra manipulação, onde os fins justificam qualquer meio, realmente a última esperança do cidadão sem condições de lutar com a máquina do estado é a Justiça.
A verdadeira preocupação com a Natureza muitas vezes ficam totalmente obscuras atrás de perguntas sem respostas:
em 1982 houve o decreto de ampliação de aproximadamente 12mil hectares do parque de 1937 para cerca de 30mil hectares. 18 mil hectares de terra os quais desde 1982 nem sequer um metro quadrado teve sua situação fundiária regularizada. Tendo 18mil hectares pra se preocupar em regularizar, muitos deles de encostas virgens de mata, porque o ICMBio, na figura do chefe do PNI, o Sr Walter Behr, só se movimentam e depositam toda a sua energia em desapropriar menos de 1000hectares de um bairro, com moradores e casas de veraneio, Hotéis, serviço de coleta de lixo e transporte escolar e urbano regular?????
Difícil responder que o interesse por traz é na preservação da Natureza, e não na possibilidade que o Núcleo Colonial oferece ao ICMBio de terras preservadas prontas, inclusive com a maior parte da estrutura, para que ele impante seu modelo excelente de "disneylização" dos nossos Parques Nacionais...
Viva o consumo, abaixo os ilegais que preservam as encostas do Rio Campo Belo, Taquaral, entre tantos outros.
Buenas olas
ToNTo

Anônimo disse...

Infelizmente e verdade. O Parque esta abandonado. Seria uma temeridade amplia-lo . Passo por la sempre pela BR 354 lotada de caminhoes poluindo a entrada do parque , sem controle de guarda florestal.