Os Tribunais Regionais Eleitorais vêm se manifestando recentemente, através de seus juizes titulares, contra a candidatura de pessoas condenadas ou que estejam respondendo a processo judicial. Dos 27 TREs do país, 17 já se pronunciaram favoráveis à medida. Mas a questão ainda está longe de uma solução definitiva, já que esse posicionamento contraria a legislação, segundo à qual só podem ser barrados aqueles que foram condenados, além de qualquer possibilidade de apelação.
Para respaldar aquela posição, será necessário apresentar emenda à Constituição. E a grande dificuldade em aprovar essa emenda é o fato, tão óbvio e desanimador, de que existem centenas de parlamentares envolvidos nos mais variados tipos de processo.
A delinqüência no poder chegou a tal nível de sofisticação, que não existem só um ou outro parlamentar envolvido em algum tipo de problemas, mas bancadas inteiras, como as “bancadas do tráfico”, oportunamente denunciadas pela também parlamentar e ex-juiza Denise Frossard.
Além das bancadas criminosas, já temos de conviver com outras bancadas inteiras eleitas, inclusive fora das questões judiciais, voltadas à defesa de interesse de grupos, especialmente daqueles de grande poder econômico como banqueiros, planos de saúde, agronegociantes de vários setores...
O que se pode ver, na atual conjuntura, é um parlamento loteado por interesses alheios aos interesses da nação, e carreiras parlamentares muito mais voltadas para objetivos pessoais do que para a solução de questões públicas. O exercício de mandatos por criminosos, inclusive reincidentes com longas fichas criminais, é apenas a pontinha do “iceberg” da permissividade que se instalou no legislativo. É o “corporativismo da culpa”, onde a questão crucial é “como condenar alguém, correndo o risco posterior de ser condenado também?”
O poder econômico e os interesses escusos regem de tal forma o nosso processo eleitoral, que não é raro que se tenha a impressão de que os candidatos sérios, honestos e responsáveis, são minoria. Até porque, possivelmente, não dispõem dos mesmos recursos para suas campanhas quanto os que já entram na eleição vendendo seus mandatos.
O eleitor com senso crítico mais apurado, aliás, poderia observar os inúmeros casos de enriquecimento inexplicável entre a classe política, especialmente daqueles que se reelegem interminavelmente, e acabam criando verdadeiras dinastias familiares se perpetuando no poder. Oh! Céus!!! Será que é tão difícil assim de perceber. Tanta gente que no início da carreira não tinha nada, e conseguiu acumular tanta riqueza!!!
Mas esses detalhes não estão marcados na testa, nem escritos nas fichas dos candidatos, de forma que o auxílio de justiça eleitoral torna-se indispensável para o esclarecimento da população. Se não puder impedir as candidaturas – não é difícil imaginar que muitos vão tentar reverter essa tendência, apelando judicialmente – pelo menos o direito de relacionar e divulgar os nomes de candidatos nessa situação já ajudaria o eleitor na hora da sua escolha.
É claro que, partindo do ponto de vista que um ou outro pode ser inocentado das acusações, como diria um advogado com que me correspondi recentemente, “pagaria o justo pelo pecador”. É um risco, com certeza. Mas um cidadão em busca de emprego pode ser recusado por ter ficha criminal, e ninguém o protege dessa circunstância. Por que deveríamos ser complacentes com os políticos, cuja atuação implica em tão grandes responsabilidades? Se algum “justo” for sacrificado, não valeria à pena, diante de tantos “pecadores” que podemos evitar de se elegerem?
Além da criminalidade, existe outra questão igualmente importante, e que não vem sendo encarada com a seriedade que merece: é o problema do despreparo dos nossos legisladores para as funções inerentes aos cargos. O analfabetismo impera, principalmente nas eleições municipais, e piora ainda entre os candidatos à vereadores. E como é que se pode esperar capacidade legislativa de cidadãos que mal sabem escrever os próprios nomes? Se por um lado não se pode condenar ou discriminar ninguém por ser analfabeto, por outro é preciso discernimento para perceber que alguém nessa situação não está à altura de exercer mandato. Se esse cidadão é um líder inato, então que seja um excelente líder comunitário, que combata, que cobre do legislativo e do executivo. Mas para fazer leis, para traduzir os anseios da comunidade, obviamente é preciso saber mais do que simplesmente assinar o próprio nome.
Enfim, eleições à vista, é normal que seja um momento de dúvidas e de avaliações por parte do eleitor. Se os TREs não conseguirem barrar os candidatos sujeitos à processo criminal, caberá ao próprio eleitor exercer a função de expurgar do poder a delinqüência que tanto nos compromete, tanto dos pontos de vista econômico e moral, quanto do social, já que nada pode se esperar de tais pessoas do que fraudes e corrupção. Como aliás, nos mostra fartamente o noticiário.
Célia Borges
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